O servidor público, seja ele federal, estadual ou municipal, é ligado ao Regime de Previdência dos Servidores Públicos. Esse regime, também chamado de Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) é contributivo e solidário, como ocorre na iniciativa privada. Dessa forma, há contribuição patronal para o sistema de benefícios e aposentadorias do servidor público. Assim, nos casos de licença de servidor, quando o mesmo se afasta sem vencimentos, o “empregador” deveria fazer o recolhimento da contribuição previdenciária de sua responsabilidade.
Mas não é isso que temos acompanhado, em todo o país, em nossa experiência de advogados previdenciaristas. Então, como se defender da cobrança ilegal da cota patronal na licença de servidor quando o mesmo se afasta sem vencimentos?
Temos recebido muitos relatos nesse sentido.
O servidor público precisa, por algum motivo, se afastar por licença, até mesmo sem receber qualquer remuneração. Por outro lado, seu “empregador”, por assim dizer, quer cobrar dele a cota patronal da contribuição previdenciária.
Seja como for, essa cobrança é ilegal.
Vimos casos, por exemplo, que o ente público quer obrigar o servidor a assinar documento comprometendo-se a pagar a cota patronal. Por conseguinte, condicionando o pagamento da contribuição para obter a licença. Outros casos em que o ente público quer exonerar o servidor por não ter feito o recolhimento.
No entanto é preciso ter em mente que a licença sem remuneração para tratar de assuntos particulares, não dá direito ao ente público de cobrar do servidor nada mais além da sua própria cota de contribuição.
Dessa maneira, se o servidor público costuma ter descontado de seus proventos a título de contribuição previdenciária 14% é somente este o valor que deverá recolher aos cofres públicos, referente ao período de afastamento.
Em resumo, não há qualquer legalidade na cobrança além do percentual já pago pelo servidor, quando na ativa, trabalhando normalmente, sem estar em licença.
E sabe por que é ilegal a cobrança da cota patronal, de servidor público em licença?
Por ser o sistema contributivo e solidário, deve o ente federativo empregador fazer o recolhimento de sua cota. Isso mesmo estando o servidor público licenciado
É interessante para o servidor, efetuar a contribuição de sua cota quando estiver de licença.
Dessa maneira o servidor mantém o direito de perceber benefícios previdenciários do sistema ao qual pertence, assim como pode usar o tempo de licença com contribuição, para somar ao tempo em outros regimes ou no mesmo regime, para fins de aposentadoria.
E qual a providência podem tomar aqueles que, por alguma razão, fizeram o recolhimento da sua cota e da cota patronal?
Por certo, podem pedir o ressarcimento do valor cobrado durante a licença de servidor, de forma ilegal.
Aos servidores que estão sofrendo alguma pressão para recolher, um importante aviso. A cobrança desse valor ilegal e inconstitucional, tem solução e cabe apelar à justiça.
Surpreendentemente, há muitos estados e municípios que possuem leis autorizando a cobrança desse valor dos servidores. Porém, a lei é inconstitucional por desrespeito à solidariedade do sistema.
É interessante verificar que as decisões no país todo são no mesmo sentido. A cobrança da cota patronal do próprio servidor é ilegal em razão do princípio da solidariedade.
Veja:
TERCEIRA TURMA RECURSAL DA FAZENDA PÚBLICA. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL EM LICENÇA INTERESSE. ALTERAÇÃO DA ALÍQUOTA DA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. INEXIGIBILIDADE DA CONTRIBUIÇÃO PATRONAL. DIREITO EVIDENCIADO.
1. O artigo 8º da Lei Estadual nº 7.672/82, com alteração inserta pelo artigo 11 da Lei Complementar nº 14.967/2016, prevê expressamente que, na hipótese de o servidor público cessar o exercício de suas atividades funcionais, sem remuneração e, ainda, sem perda do vínculo, sujeita-se ao recolhimento da contribuição previdenciária de sua competência (14%) e, ainda, daquela de competência do Estado (28%).
2. Ocorre que a modificação do reajuste fere a proporcionalidade e a razoabilidade, uma vez que inviabiliza o exercício da Licença Interesse ao exigir do servidor, que goza de licença não remunerada, contribuição previdenciária de sua competência (14%) e, ainda, daquela de competência do Estado (28%) sobre o que receberia se estivesse em atividade. 2.O repasse da responsabilidade de recolhimento da alíquota de contribuição previdenciária patronal para o servidor que goze de licença não remunerada, além de dificultar e onerar excessivamente o gozo da licença, descaracteriza a repartição do custeio dos benefícios previdenciários.
3. Sentença de… procedência mantida por seus próprios fundamentos. RECURSO INOMINADO DESPROVIDO. UNÂNIME. (Recurso Cível Nº 71007999188, Terceira Turma Recursal da Fazenda Pública, Turmas Recursais, Relator: Alan Tadeu Soares Delabary Junior, Julgado em 28/03/2019). Encontrado em: Terceira Turma Recursal da Fazenda Pública Diário da Justiça do dia 10/04/2019 – 10/4/2019 Recurso Cível
Em princípio, não costumamos cansar nossos leitores com transcrição de jurisprudências. Em contrapartida, se o servidor não verificar como decidem os tribunais, pode ficar receoso de exigir seus direitos.
Sendo assim, sabendo haver leis que definem que a cota patronal é devida e deve ser paga pelo servidor que entrar em licença, destacamos outra decisão favorável nesse sentido.
E M E N T A – REMESSA NECESSÁRIA E RECURSOS DE APELAÇÃO – MANDADO DE SEGURANÇA – CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DE SERVIDOR PÚBLICO MILITAR EM LICENÇA PARA TRATAR DE INTERESSES PARTICULARES – DEVIDO O RECOLHIMENTO DA COTA DE SEGURADO – RECOLHIMENTO DA COTA PATRONAL PELO SERVIDOR INCABÍVEL.
01. A licença para tratar de interesses particulares encontra-se prevista nos artigos 47, XIV, 61, parágrafo único, b e 64 da Lei Complementar Estadual n. 53/90 e caracteriza-se como a autorização para afastamento total do serviço que é concedida aos militares que possuem mais de 5 anos de efetivo serviço, o tempo de licença é sempre com prejuízo da remuneração, bem como contagem do tempo de serviço.
02. Nos termos da Lei n. 3.150/2005, é mantido o vínculo funcional entre o servidor e administração,razão pela qual é devido o pagamento da contribuição previdenciária pelo segurado ainda que em licença para tratar de interesses particulares.
03.O pagamento pelo servidor da cota patronal viola o princípio da solidariedade, estabelecido pelo art. 40, da CF/88, nos seguintes termos: “Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo”. Recursos conhecidos e não providos. Sentença mantida em sede de remessa necessária. (TJ-MS – APL: 14120841920158120000 MS 1412084-19.2015.8.12.0000, Relator: Des. Vilson Bertelli, Data de Julgamento: 28/05/2019, 2ª Câmara Cível, Data de Publicação: 30/05/2019)
Até a próxima, com mais informações de extrema relevância para você.
Formada em Direito pela UCDB em 2000. Inscrita na OAB/MS sob o nº 8.596 e OAB/SP 38.2499. Especialista em Direito Previdenciário, Pós Graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Escola da Magistratura do Trabalho de Mato Grosso do Sul. Coordenadora Adjunta do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário. Secretária da Comissão dos Advogados Trabalhista da OAB/MS e membro da Comissão dos Advogados Previdenciaristas da OAB/MS. Diretora na Associação dos Advogados Trabalhistas AAT/MS. Palestrante. priscila@arraesadvogados.com.br .
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