Qual o valor do sonho de estudar balé em Nova York? Para três jovens da Cidade de Deus, no Rio de Janeiro, custa R$ 15 mil. Estudantes da Academia Valéria Martins, Daniel Coelho, de 19 anos, Gabrielle Bezerra, de 16, e Ana Caroline Baptista, de 15, conseguiram bolsas de estudos na Companhia Ajkun, nos Estados Unidos, e agora correm contra o tempo para arrecadar fundos e custear as passagens e estadia no outro país. As meninas ainda farão uma ponte na Itália para uma apresentação no Dance in Italy Program nos meses de junho e julho de 2021 antes de aterrissar em terras norte-americanas. Esse sonho começou com a ajuda da professora e coreografa Valéria Martins que dá aulas de balé em um quartinho em cima da casa da sogra para 44 jovens da comunidade. Em entrevista à Jovem Pan, ela contou que o projeto nasceu como uma ideia simples e temporária. “Estou há cinco anos na Cidade de Deus e a nossa ideia inicial era ser um projeto na Favela Criativa, era temporário, mas eu continuei dando aula a preços populares. Eles se formam e dão aula para os menores, é assim que a gente faz”, explicou.
A Academia não recebe doações – tudo é por conta da Valéria ou com a ajuda da mensalidade dos alunos. “Cada um paga o que pode. Tem uns que pagam R$ 15 outros pagam R$ 50. Com isso pago água, luz e custos de limpeza do local. Porque o aluguel eu não pago por ser da minha sogra”, disse. Com três estudantes indo para fora do país, a professora se diz orgulhosa e quer ainda mais para os outros alunos. “Foi muito legal porque esses meninos sempre estudaram ali, a alegria no meu coração é muito grande por dar destino para eles, traçando um futuro e uma carreira. Agora meu sonho é levar todos, não só para Nova York, mas para lugares que eles possam ser encaminhados para a carreira profissional”, contou.
A dedicação às aulas valeu a pena e Daniel é grato pelo apoio de Valéria. “Sou muito agradecido a Val pois foi uma das primeiras pessoas a acreditar no meu sonho e não desistir de mim”, revelou. O jovem de 19 anos ingressou no balé aos 15, mas conseguiu se destacar e participar de um festival com a presença de Chiara Akjun, responsável pela companhia de dança. “Em uma das apresentações eu caí, mas terminei sorrindo. Daí veio uma assessora dela [Chiara] e pediu para que eu repetisse o solo. Por fim, ela me contemplou com a bolsa de 100%, que sou muito grato e não vejo a hora de viver essa oportunidade”, disse.
De família humilde e sem falar inglês, Daniel quer aproveitar ao máximo a experiência e viver seu sonho. “Meu planejamento é aproveitar o máximo das aulas, aprender muito e aproveitar a viagem pois nunca viajei. Vou ficar um mês, depois volto por causa do visto e em seguida serei avaliado. Dependendo do resultado, voltarei com propostas de emprego pra ficar lá entre três a quatro anos”, revelou o bailarino, que aconselha futuros dançarinos a nunca desistirem. “Muitas pessoas irão te desanimar, não irão acreditar em você. Não desista, basta lutar e correr atrás daquilo que deseja, nada é impossível para aqueles que sonham”, disse.
Conexão Itália – Nova York
Parceiras de Daniel na Academia Valeria Martins, Ana Caroline e Gabrielle fizeram um caminho diferente para conquistar a vaga na Cia Akjun. “Eu e a Ana fizemos uma prova online. Tivemos que fazer duas vezes porque na primeira faltou luz e a Chiara não conseguiu ver o que estávamos fazendo. A Valéria saiu correndo junto com a minha mãe para buscar alguma coisa pra iluminar. Fizemos essa primeira prova no calor, no escuro. O tradutor que estava nos auxiliando falou que a Chiara queria refazer a prova com a gente. Refizemos e ela nos elogiou bastante”, contou Gabrielle. As duas ganharam bolsa de 50%, mas a jovem de 16 anos também teve alguns toque de Chiara. “Ela disse que adorou minha técnica, mas que eu tinha que emagrecer um pouco”. Antes de chega em Nova York, Ana e Gabrielle vão participar por um mês do festival Dance in Italy Program. Apesar da empolgação, as meninas se preocupam com os custos da viagem. “São muitas coisas que tem que resolver. Como dinheiro da passagem, dinheiro pra levar caso precise de algo, roupas necessárias e uniforme de ballet que não é nada barato”, revelou Gabrielle.
Arrecadação solidária
Ao perceber os altos custos da viagem, a professora Valeria Martins decidiu abrir uma vaquinha online para ajudá-los a pagar as contas. A meta é de R$ 15 mil. “Creio que vai dar mais, porém quando fiz a vaquinha pensei em um valor que pudesse ser atingido. Também faremos eventos aqui na comunidade para levantar o valor”, disse Valéria. Até o fechamento desta reportagem, pouco mais de R$ 1.500 haviam sido doados. O dinheiro será para as passagens das meninas e a remarcação da passagem de Daniel, que tinha comprado os tickets antes da pandemia da Covid-19. Além de ajudá-los a se manter na cidade por um mês. Ana e Gabrielle também precisam tirar o passaporte e o visto americano, um custo adicional. “Tudo o que sonhamos e queremos é possível basta acreditar e batalhar firme pra que tudo aconteça. Acho que se tiver amor e desejo de querer que dê certo, seja qualquer sonho, vai dar certo”, finalizou Gabrielle.
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