segunda-feira, 25 de maio de 2020

Mortalidade entre pacientes graves com a Covid-19 é de 66%, diz estudo

Um levantamento do Projeto UTIs Brasileiras, da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (Amib) e do Epimed – uma ferramenta de análise de dados e desempenho hospitalar, mostra que apenas um em cada três pacientes em estado grave pela Covid-19 sobrevive. A pesquisa indica taxa de mortalidade de 66%, número muito alto quando comparado aos dados internacionais.

A coleta de informações foi feita entre os dias 1º de março e 15 de maio em 450 hospitais públicos e privados em todo o Brasil, envolvendo 13.600 leitos de terapia intensiva – o que equivale a cerca de um terço das vagas para adultos nessas unidades.

O estudo considera como os pacientes mais graves pessoas internadas em uma unidade de terapia intensiva (UTI) e que demandam apoio de ventilação mecânica. No geral, a mortalidade desses doentes é alta em qualquer lugar do mundo. No Reino Unido, por exemplo, é de 42%, e, na Holanda, chega a 44%. Um outro estudo, restrito à cidade de Nova York, revelou um porcentual ainda mais alto, de 88%.

“A mortalidade geral na UTI é de 21%, entretanto, entre a população de pacientes mais graves, chega a 66%. Ou seja, de cada três pacientes que vão para a ventilação mecânica, apenas um sobrevive. Essa doença não é uma gripezinha”, compara o coordenador do Projeto UTIs Brasileiras, o médico intensivista Ederlon Rezende.

O médico Jorge Salluh, pesquisador do IDOR e fundador da Epimed Solutions, concorda com o colega e especula sobre as razões da mortalidade tão alta. “Eu não tenho esses dados, é uma inferência, mas o que parece é que estamos esquecendo de medidas de prevenção adotadas nas UTIs. O uso de tratamentos experimentais, como a cloroquina e outras substâncias, todas igualmente com poucas evidências, podem ser um fator. Intervenções farmacológicas não comprovadas aumentam o risco de morte por efeitos colaterais”, comenta.

Os dados das UTIs são levantados a partir de questionários respondidos diariamente sobre os pacientes e os procedimentos adotados. Os medicamentos ministrados não constam do levantamento. “Pessoalmente, acho que o uso da hidroxicloroquina tem prejudicado nossos pacientes, principalmente aqueles que evoluem com a forma grave da doença e vão para as UTIs”, afirmou Rezende. “Mas estes dados não nos permitem afirmar isto”, completa.

A infectologista da Unicamp Raquel Stucchi tem opinião semelhante. “Pelos estudos com pacientes graves já publicados, sabemos que a cloroquina aumenta o risco de efeitos adversos e morte. Mas não dá para inferir isso para o Brasil enquanto não soubermos quem usou e quem não usou a droga.”

A taxa de mortalidade é similar nas unidades privadas (65%) e públicas (69%). Os especialistas lembram, no entanto, que os hospitais que participam do levantamento tendem a ser os mais bem organizados, o que pode levar a um retrato mais otimista da realidade. “Temos de olhar para esses dados com a ideia de que sejam melhores do que o do nosso mundo cão, em hospitais que não estão organizados e já apresentam o sistema colapsado”, diz o especialista.

Um outro dado que chamou a atenção dos pesquisadores foi a faixa etária dos pacientes. Cerca de 41% têm menos de 65 anos. O porcentual é ainda mais alto (51%) entre os internados por síndrome respiratória de caráter infeccioso – condição que pode indicar casos não diagnosticados de coronavírus.

A grande maioria dos internados em UTIs com a Covid-19 (71%) ou com a síndrome respiratória (75%) apresenta alguma comorbidade, como problemas cardíacos, diabetes e obesidade. “Ainda assim, é bom ressaltar que cerca de 30% não tinham nada. Ou seja, a doença pode afetar qualquer pessoa.”, lembrou o coordenador do levantamento.

Outro dado mostra que o tempo de permanência nas UTIs por covid-19 é bem acima da média de outras condições, chegando a dez dias. “Além de serem muitos pacientes em situações muito graves, eles ficam muito tempo na UTI e o giro de leito fica bastante restrito.”

A taxa de ocupação das UTIs revelada por esse levantamento já é alta: 88% na rede pública e 74% na rede privada. No entanto, os especialistas acham que estes números já estão subestimados. “O nosso levantamento começou no início da epidemia; tem aí um momento bom”, afirmou Rezende. “Hoje, os porcentuais já estão acima disso, com o sistema já colapsado. Provavelmente os próximos 30 dias serão mais difíceis.”

*Com informações do Estadão Conteúdo

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